Rainha de Bateria, dona de mais de 10 títulos do carnaval de Campo Grande, 38 anos, mãe, advogada, funcionária pública federal, dançarina, apresentadora e por aí vai. Rebecca D’Albinie cresceu carregada de Cultura, riscou o chão com um samba admirável e conquistou a sociedade com inteligência, carisma, beleza e muito respeito. Símbolo histórico do Carnaval de Mato Grosso do Sul, ela sempre soube onde quer chegar, segue trilhando seu caminho e desbravando novos horizontes.

Quem é Rebecca D’albinie?
R: Eu acredito que, falando pela minha essência. Sou uma mulher que tenho ambições e sonhos. Busco realiza-los todos os dias e em todos os momentos, sempre com muita sinceridade e honestidade, principalmente comigo mesma.
Ativista Indigenista, aos seus olhos, qual a maior batalha que eles enfrentam hoje?
R: Aqui em Mato Grosso do Sul, temos uma divisão de status, tanto por regiões quanto por etnias. No Conesul do Estado e creio que algumas partes do Brasil, existe a demanda fundiária que é muito triste, pois, traz uma instabilidade grande, principalmente socioeconômica para os indígenas, que é extrema pobreza mesmo e a pobreza em si é muito triste. Acredito que para essas pessoas que estão no Conesul, na nossa região são os Guarani Kaiowá e para o resto do Brasil, que tem pontos específicos com problemas fundiários, essa é a maior questão problemática. Já o embate político indígena ninguém fala. Falo como indigenista. O embate político indígena divide as comunidades indígenas, em regiões como Campo Grande, Aquidauana, Miranda, que são os Terenas, pois, possuem autonomia que é própria dos povos indígenas segundo a convenção 69 da OIT e disputam a liderança, o que muitas das vezes enfraquece o movimento. Sendo assim vejo essa disputa entre os Terenas, como uma questão problemática também.

O que o Carnaval representa para você?
R: Representa minha realização artística, desde de muito criança. O carnaval me ensinou muitas coisas, especialmente a ser grata por todos os caminhos onde eu chegar e por todos os espaços onde eu vier a ocupar. Hoje só cheguei onde estou, no meu especto artista, por conta do carnaval, por incrível que pareça, pois, soube aproveitar as oportunidades que o carnaval me trouxe, logo, ele representa muito para mim. Sou muito grata e sempre terei orgulho da minha origem ter sido o carnaval.
Quando nasceu a Rainha?
R: A Rainha nasceu quando passei a entender a importância de uma figura de muita representatividade para sua comunidade e para aquelas pessoas que acreditam ainda no carnaval como manifestação artística. Comecei o reinado sem entender direito o que era uma Rainha, com 16 anos, mas só depois que fui mãe tomei consciência qual era meu papel na sociedade, ainda mais como Rainha.

É mais difícil ser mãe de adolescente ou Rainha de bateria?
R: É mais difícil ser Rainha de Bateria, por incrível que pareça. Não temos incentivos no Mato Grosso do Sul. As escolas de samba precisam empreender e pensar mais em seus componentes, conforme cada um tem as suas especificidades. Uma Rainha precisa ser trata com muita especificidade, porque ela é única, ela é só uma pessoa que representa muita coisa e está na frente do coração da bateria da escola de samba. Muitas vezes, sem incentivo, você se enfrenta uma série de dificuldades. Eu como Rainha me sinto só em muitos momentos, mesmo tendo uma comunidade me olhando, admirando, batendo palmas, porque o trabalho em si é muito solitário. Já ser mãe de adolescente é tranquilo, porque meu filho é um adolescente bem criado, sempre priorizei inteligência emocional, logo ele não dá trabalho e nossa relação é marcada pelo diálogo.

Como você se sente sendo a Rainha de bateria mais conhecida da história do Carnaval de MS?
R: Não sei se sou tudo isso, mas fico lisonjeada, feliz, orgulhosa da minha trajetória e quero defender ainda mais o carnaval. Gostaria de levar a minha essência sul-mato-grossense para fora de Mato Grosso do Sul e para isso preciso deixar fisicamente o carnaval de Campo Grande, para ir a São Paulo ou ao Rio de Janeiro e representar de onde eu vim. Fico lisonjeada, mas isso não sobe a minha cabeça, é tranquilo.
Por que Cultura é uma palavra uníssona a Rebecca?
R: Porque a nossa existência é marcada pelas relações interpessoais, que é tudo de mais importância que temos em nossa existência, a verdade é essa. Ninguém sobreviverá sozinho. São dessas relações interpessoais que surgem lá na sua origem, lá na base, como viga mestra a Cultura, porque a cultura nada mais é que a relação entre as pessoas. Enxergo a cultura em todos os lugares realmente e que bom que enxergo assim, porque além do que é artístico, vejo a existência do ser humano por mais simples que seja, por menor que seja o status socioeconômico.
Você possui um multiverso de funções, como é conciliar tudo?
R: Tem sido enlouquecedor. Vou a psicóloga, necessito inclusive de social media, mas aprendi com os anos e com a ambição pelos meus se realizarem, a contornar todas as dificuldades e a extrair de todas as Rebeccas, o melhor. Quando digo que é enlouquecedor é porque só temos vinte e quatro no dia, sendo oito dormindo, então prezo muito pela saúde mental, priorizando o sono e assim consiga realizar tudo, porque a tendência é só aumentar a quantidade de coisas a fazer. Interessante que consigo dar conta de executar muitas coisas diferentes em si, mas acho que faço muito bem feito.
Você jamais deixou de lado seus objetivos. Como mulher, mãe e afins, o que mais te incomoda na sociedade em sua maioria machista no Brasil?
R: O que mais me incomoda é a falta de letramento nas pessoas como um todo. Não entendem e não enxergam comportamentos machistas se perpetuando. Muitas vezes crianças em muitas famílias, onde mulheres também são machistas e ratificam essa cultura na infância, formando adultos abusadores. O letramento é estudar e descobrir informações que você não conhecia sobre algo e o machismo está embutido em tantos aspectos da nossa vida. Quando você estuda, enxerga tanta coisa que antes você não enxergava, sendo assim deveríamos ter letramento via campanha, nas escolas, o que reduziria consideravelmente o machismo.
O que a Rebecca de hoje diria para Rebecca da Infância que viajou para Índia?
R: Direi o mesmo que a Rebecca de hoje diria a Rebecca do futuro: “tudo ficará bem”. Na ansiedade acreditamos que nunca alcançaremos nossos objetivos. Desde criança quis ser artista, mas nunca sabemos o caminho que traçaremos para chegar num lugar. Não sabia nem em qual lugar chegaria. Hoje com mais maturidade consigo aceitar e compreender que o caminho de cada um é imutável. O universo que nos conduz para que possamos cumprir tudo que devemos cumprir, então falaria a Rebecca da infância “Vai ficar tudo bem, vai dar tudo certo”.
Júnior Borges.
